AS NOVAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS 2021

8 de março de 2022

Por Antonio Domingos Dal Más


Em 01 de janeiro de 2021, com exceção dos prefeitos que serão reeleitos teremos um contingente muito grande de novos prefeitos que assumirão pela primeira vez o comando de vários municípios no Brasil. Com eles, assumirão novas equipes de governo formadas por secretários, diretores e assessores nomeados, que irão ingressar no serviço público sem concursos ou processos seletivos, pois assim autoriza a legislação e aconselha a política. A grande maioria dos novos integrantes nunca tiveram experiência profissional relacionada ao setor público. Alguns nem sequer tiveram relação profissional com a área específica que irá comandar dentro da administração. É o caso de secretários de obras que não possuem formação técnica, secretários de saúde com formação acadêmica em outras áreas como: direito, administração, etc., secretários de administração que nunca administraram sequer uma pequena empresa serão empossados. Isso ocorre por se tratar de pessoas ligadas ao prefeito, que ajudaram na coordenação da campanha eleitoral, doaram dinheiro para campanha, ajudaram montar os palanques do comício, cuidaram da segurança ou organização dos cabos eleitorais, amigos mais próximos, até quem realmente pensou no plano de governo.


Num segundo momento virão os indicados pelos vereadores, principalmente os que darão apoio político aos prefeitos. O famoso e lamentável dá lá toma cá, que infelizmente é fruto de herança cultural difícil de se desvencilhar. A questão da competência profissional para ocupar um cargo importante na Administração Pública aparece quase sempre, como último requisito, isso se a pessoa não tiver ligações com partidos de oposição ao prefeito. Apesar disso, a funcionabilidade de todos os órgãos da administração será mantida pelos funcionários concursados que desenvolvem a tempos suas funções. Caberá aos novos gestores, aprimorar os serviços desenvolvidos, melhorar a qualidade, diminuir custos, para poderem investir em novos equipamentos públicos. Isso se tiver o empenho da grande parte dos funcionários públicos concursados, que na maioria das vezes estão desmotivados por questões salariais, falta de capacitação/especialização, quando não se sentem desprestigiados por verem pessoa estranha em cargo superior imediato.

Temos ainda, a questão da estabilidade no emprego público para os concursados, um problema que proporciona uma “segurança” para os profissionais que, na grande parte, considera só precisar fazer o básico da função (porque não serão demitidos). Muito comum novos gestores ouvirem dos servidores a seguinte frase após uma reprimenda ou cobrança: “Você pode até tentar me prejudicar de alguma forma, mas nunca esqueça que quando você chegou, eu estava aqui e quando você sair eu vou continuar aqui”. As dificuldades maiores para gerir os municípios terão os prefeitos eleitos pela primeira vez e como oposição. Esses serão vigiados mais intensamente pelos opositores que não apoiarão e farão o possível para que as coisas não deem certo. Nesse momento a falta de experiência no setor público será cruel.


A maioria dos gestores assumirão cargos sem nunca ter lido a Lei Orgânica do Município, não terá conhecimento da arrecadação e despesas, por que não entenderá, ainda que veja balanços financeiros dispostos geralmente de forma nem sempre clara no portal da transparência do município. Novos gestores lidarão com um contingente de funcionários desmotivados principalmente por defasagem salarial. Não raro em pouco tempo começam as cobranças e reivindicações. Os gestores terão como fiscais de suas ações: a Câmara de Vereadores, Ministério Público, Tribunal de Contas Estadual e Federal; Órgãos Estatais (no caso de convênios públicos) e principalmente a população, que não dará tréguas, principalmente quando um interesse particular estiver em questão. A máquina pública no Brasil é feita para não funcionar. Para cada agente de execução há pelo menos cinco de fiscalização.


Com os atuais hábitos sociais, principalmente a velocidade das informações, serão cobrados diuturnamente nas redes sociais, onde serão escrachados publicamente pelos seus atos, ou pela omissão deles. Uma máquina de moer reputação. Além das dificuldades a serem enfrentadas pela falta de experiência de gestão pública, a falta de experiência política dos novos prefeitos será outro grande entrave para administrar. A boa relação com a Câmara Municipal é fundamental, uma vez que o contrário pode até inviabilizar o próprio mandato de 4 anos, além de que, mudanças legislativas, novas Leis, aprovação das contas anuais, aprovação e suplementações da Lei de Diretrizes Orçamentárias e outras de interesse da Administração, serão questões do cotidiano da Administração. A boa relação com os Gestores Públicos Estaduais e Federais será muito importante para formalização de convênios públicos para obtenção de verbas para investimentos em infraestrutura (casas populares, saneamento básico, pavimentação, creches, escolas, equipamentos para saúde, etc.). De nada adiantará uma boa relação com essas esferas públicas, se a prefeitura não possuir um bom quadro técnico para produzir os projetos exigidos e fazer as devidas prestações de contas ao final dos convênios.


Será necessário também articulação política com a Assembleia Estadual e Câmara Federal, além do Senado, para recebimento das famosas emendas parlamentares, as quais muitos deputados e senadores distribuem como se fosse dinheiro de sua propriedade e consideram a destinação, um favor ao município. A retribuição do prefeito será atrair votos para eles, nas próximas eleições.
O Cargo de Prefeito Municipal exige muito mais que carisma e simpatia. Para fazer uma gestão eficiente é necessário, dentre vários atributos, principalmente: ter timbre de administrador, equilíbrio emocional, determinação, persistência, entrega pessoal e contar com uma boa equipe de assessores. Como reflexão fica aqui a frase que ouvi do ex-prefeito, Hélio Gomes 
(in memoriam) da cidade de Presidente Epitácio – SP,


“O Prefeito é um sujeito que quando ri, um monte de gente ri com gargalhadas ao lado dele, mas quando ele chora, o faz sempre sozinho”.


Está na hora de se pensar na criação de um núcleo de gerência das cidades, permanente, profissionalizado e disponibilizado, tornando a gestão pública mais eficiente, com profissionais qualificados que administrem tecnicamente a máquina pública em conjunto com as ações políticas comandadas pelos prefeitos.

Autor: Antonio Domingos Dal Más

Por Pinheiro Pedro Advogados 23 de outubro de 2025
Sancionada pelo Presidente Lula agora no mês de outubro, a Lei nº 15.228/2025, que institui o chamado Estatuto do Pantanal , é o primeiro marco legal federal voltado especificamente à conservação, restauração e uso sustentável desse bioma único. A matéria segue agora para sanção presidencial, marcando um passo histórico no arcabouço jurídico-ambiental brasileiro. Um vácuo jurídico que se encerra Apesar de o artigo 225 da Constituição Federal reconhecer o Pantanal como patrimônio nacional, até então inexistia legislação federal exclusiva que tratasse de sua proteção. A lacuna vinha sendo preenchida pela aplicação de normas ambientais gerais ou por legislações estaduais de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Essa ausência gerava insegurança regulatória e dificuldades de harmonização entre as práticas produtivas, a conservação ambiental e o desenvolvimento socioeconômico. Em 2024, inclusive, o Supremo Tribunal Federal (STF) havia determinado que o Congresso legislasse sobre o tema, pressionando pela criação de um marco normativo específico. O que dispõe o Estatuto do Pantanal A nova lei inova ao estabelecer diretrizes próprias para o bioma. Entre seus principais pontos, destacam-se: · Uso sustentável e compatível : qualquer atividade econômica no Pantanal deverá atender a critérios de sustentabilidade, prevenindo a exploração predatória. · Manejo do fogo : a utilização do fogo passa a ser permitida apenas em situações específicas, como prevenção de incêndios, pesquisas científicas, manejo integrado e práticas culturais de comunidades tradicionais. Em todos os casos, é necessária autorização prévia do órgão ambiental competente e apresentação de plano de uso. · Selo “Pantanal Sustentável” : cria-se um mecanismo de certificação para bens e serviços produzidos de forma sustentável, inclusive em atividades turísticas, agregando valor econômico às práticas compatíveis com a conservação. · Financiamento e incentivos : o texto prevê o uso de recursos do Fundo Nacional do Meio Ambiente, doações e fundos patrimoniais para custear programas de conservação e pagamento por serviços ambientais. · Integração federativa : as metodologias e regulamentos já adotados por Mato Grosso e Mato Grosso do Sul poderão ser aproveitados, evitando sobreposição de normas e valorizando experiências consolidadas. · Valorização cultural : reconhece o uso tradicional do fogo e práticas ancestrais de comunidades pantaneiras, respeitando sua identidade e modo de vida. Relevância jurídica e socioambiental A aprovação da lei representa não apenas um avanço regulatório, mas também um marco simbólico: é o reconhecimento, em nível federal, de que o Pantanal demanda tratamento diferenciado e normatização específica. Para o setor jurídico, a norma tende a reduzir conflitos de interpretação, já que muitas vezes atividades lícitas sob a ótica estadual esbarravam em entendimentos mais restritivos de normas federais gerais. Agora, o Estatuto confere maior segurança jurídica a empreendedores, comunidades e órgãos ambientais. Além disso, a criação do selo de certificação pode estimular cadeias produtivas sustentáveis, conectando conservação ambiental com ganhos econômicos. Do ponto de vista internacional, a medida também reforça a imagem do Brasil como país comprometido com a preservação de seus biomas, o que pode gerar reflexos positivos em acordos comerciais e ambientais. Vem desafio por aí! Apesar dos avanços, a efetividade da lei dependerá de fatores cruciais: 1. Estrutura de fiscalização : a legislação só terá efeito prático se houver capacidade de monitoramento, o que exige fortalecimento institucional nos estados e na União. 2. Recursos financeiros contínuos : sem repasses estáveis e planejamento orçamentário, os instrumentos de incentivo podem se tornar meramente declaratórios. 3. Harmonização normativa : será preciso compatibilizar as regras federais com legislações estaduais já vigentes, evitando conflitos de competência e sobreposição de obrigações. 4. Regulamentação detalhada : conceitos como “uso sustentável” e “manejo controlado” precisam ser devidamente definidos em regulamentos, sob pena de abertura para litígios e judicializações. 5. Participação social : a efetividade dependerá do envolvimento de comunidades tradicionais, produtores locais e entidades da sociedade civil, garantindo legitimidade e adequação às realidades regionais. Finalizando, podemos considerar que a criação do Estatuto do Pantanal encerra uma lacuna histórica e inaugura um novo ciclo de políticas ambientais para o bioma. Contudo, como ocorre em muitas áreas do direito ambiental, a distância entre a norma e a realidade prática ainda é significativa. Cabe ao Poder Público assegurar meios para a execução da lei e à sociedade civil acompanhar e fiscalizar sua implementação. Já ao setor produtivo e às comunidades locais, abre-se a oportunidade de alinhar desenvolvimento econômico com práticas sustentáveis, construindo um modelo de gestão que preserve o patrimônio natural e cultural pantaneiro. Em última análise, trata-se de um avanço normativo que precisa ser consolidado por meio de ação coordenada, financiamento estável e efetiva fiscalização , sob pena de transformar-se em um marco legal sem efetividade prática.
Por Pinheiro Pedro Advogados 23 de setembro de 2025
Em abril de 2025 foi sancionada a Lei nº 15.126, que acrescenta ao marco legal do Sistema Único de Saúde (SUS) o princípio da atenção humanizada. A norma representa um avanço no campo legislativo da saúde pública ao reconhecer, de forma expressa, que o atendimento ao paciente deve considerar não apenas aspectos físicos, mas também dimensões emocionais, subjetivas e sociais que compõem o cuidado em saúde. O que diz a lei A nova legislação altera a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/1990), reforçando que os serviços do SUS devem ser pautados pela atenção integral e humanizada. Na prática, isso significa que o Estado assume o dever de assegurar que o tratamento não se limite à prescrição médica ou ao controle de sintomas, mas envolva também: acolhimento adequado às necessidades do paciente; respeito à dignidade e singularidade de cada indivíduo; valorização da escuta, do vínculo e da participação do paciente no próprio cuidado; promoção de políticas públicas que reconheçam a saúde como fenômeno biopsicossocial. Mudanças práticas Embora o princípio da humanização já estivesse presente em políticas do Ministério da Saúde — como a Política Nacional de Humanização (PNH) —, sua inclusão em lei fortalece o caráter jurídico da obrigação. Isso cria: maior respaldo legal para usuários do SUS que se sintam desrespeitados ou vítimas de atendimento desumanizado; parâmetro normativo para o Poder Judiciário em casos de litígios envolvendo negativa de atendimento, internações e tratamentos; obrigação mais clara para gestores públicos e profissionais de saúde no planejamento e execução dos serviços. Em especial na área de saúde mental, a lei reforça a diretriz da Reforma Psiquiátrica (Lei nº 10.216/2001), garantindo que pessoas em sofrimento psíquico recebam tratamento digno, baseado em cuidado integral e não apenas em medidas medicalizantes ou hospitalares. Impacto nos planos de saúde privados Embora a Lei nº 15.126/2025 se destine diretamente ao SUS, seus efeitos podem ultrapassar o sistema público. Isso porque: Parâmetro interpretativo: princípios reconhecidos em lei costumam ser invocados pelo Judiciário como referência também para a saúde suplementar. Assim, pacientes de planos de saúde podem se valer do conceito de atenção humanizada em ações judiciais para exigir tratamentos mais abrangentes e respeitosos. Pressão regulatória: a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) pode, futuramente, adotar resoluções que alinhem os planos privados às diretrizes de humanização, acompanhando a evolução normativa do SUS. Proteção do consumidor: pelo Código de Defesa do Consumidor, operadoras de saúde devem prestar serviços adequados, eficientes e seguros. A incorporação do princípio da atenção humanizada ao ordenamento pode reforçar o entendimento de que a ausência de acolhimento digno configura falha na prestação do serviço. É bom refletir A inclusão do princípio da atenção humanizada no marco legal da saúde brasileira consolida uma tendência: reconhecer que o cuidado deve abranger corpo, mente e contexto social. Para pessoas em vulnerabilidade psiquiátrica, esse respaldo jurídico é ainda mais significativo, pois assegura a possibilidade de reivindicar atendimento digno e integral em momentos de fragilidade. No campo da saúde suplementar, embora a lei não imponha obrigações imediatas aos planos privados, cria bases para que a humanização se torne parâmetro também na iniciativa privada, seja por via judicial, seja por futuras normativas regulatórias. Neste Setembro Amarelo, quando se intensificam as reflexões sobre saúde mental e prevenção do suicídio, a sanção dessa lei ganha relevo adicional. Ela reafirma que o direito à saúde não se limita ao tratamento de doenças, mas envolve o acolhimento humano, a escuta atenta e a valorização da dignidade em todas as etapas do cuidado. Assim, a Lei nº 15.126/2025 não apenas fortalece o SUS, como também abre caminho para uma visão mais ampla e inclusiva do direito à saúde, em sintonia com os desafios contemporâneos da saúde mental e com a urgência de políticas públicas sensíveis à condição humana.
Por Pinheiro Pedro Advogados 17 de setembro de 2025
Nos últimos anos, a digitalização tem impactado diversas áreas da vida social e econômica, e o Direito não é exceção. Um exemplo recente desse movimento é o crescimento do interesse por testamentos digitais e pela utilização de ferramentas tecnológicas no planejamento sucessório em vida. O que é o testamento digital? O testamento, em sua essência, é o ato jurídico pelo qual uma pessoa dispõe de seus bens, direitos e vontades para depois de sua morte. A versão “digital” desse instituto refere-se a disposições de última vontade elaboradas e registradas por meio eletrônico, seja em plataformas digitais, seja em documentos armazenados em nuvem ou em dispositivos pessoais. Ainda que a expressão “testamento digital” seja cada vez mais mencionada, é importante destacar que a legislação brasileira não possui, até o momento, uma disciplina específica sobre o tema. Isso significa que, para que o documento tenha validade jurídica, é necessário observar as formas tradicionais de testamento previstas no Código Civil: o público, o cerrado e o particular. Assim, ainda que o conteúdo esteja armazenado em meio digital, o instrumento precisa respeitar os requisitos legais – como testemunhas, formalização em cartório ou escritura pública, a depender da modalidade escolhida. Patrimônio digital e novas questões jurídicas Além da disposição de bens materiais, a era digital trouxe à tona um novo campo de debate: o patrimônio digital. Perfis em redes sociais, contas em plataformas de streaming, acervos digitais, criptomoedas e demais ativos virtuais passaram a fazer parte da sucessão. A destinação desses bens imateriais levanta desafios jurídicos, uma vez que a legislação atual ainda não trata de forma detalhada a sucessão de direitos digitais. Planejamento sucessório em vida Paralelamente ao testamento, observa-se o crescimento da prática do planejamento sucessório em vida. Trata-se da adoção de medidas jurídicas que permitem organizar previamente a transferência do patrimônio, assegurando clareza e reduzindo riscos de litígios entre herdeiros. Instrumentos como a doação em vida, a constituição de holdings familiares, pactos sucessórios e outros mecanismos podem ser utilizados dentro dos limites legais. Além de oferecer maior previsibilidade, o planejamento sucessório contribui para a preservação da harmonia familiar e pode, em alguns casos, otimizar aspectos tributários relacionados à transmissão de bens. Desafios e perspectivas O cenário atual evidencia um paradoxo: de um lado, há uma demanda crescente por soluções digitais voltadas à sucessão patrimonial; de outro, existe uma lacuna normativa que ainda demanda regulamentação específica. Nesse contexto, é essencial que a sociedade e os operadores do Direito acompanhem as mudanças tecnológicas, ao mesmo tempo em que respeitam os marcos legais vigentes. Enquanto o legislador não estabelece regras próprias para o testamento digital, o caminho seguro é alinhar as inovações tecnológicas com os formatos já previstos no Código Civil. Assim, garante-se que a manifestação de vontade tenha validade e eficácia jurídica.