STJ autoriza inclusão de cônjuge em execução de título extrajudicial: entenda a decisão e seus impactos
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu, recentemente, decisão de grande relevância para o direito civil e para a prática da execução de dívidas. No julgamento do Recurso Especial n.º 2.195.589, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, o Tribunal reconheceu a possibilidade de inclusão do cônjuge do devedor no polo passivo da execução de título extrajudicial, mesmo quando a dívida foi formalmente contraída apenas por um deles.
O caso envolve casal casado sob o regime de comunhão parcial de bens, no qual o marido havia emitido cheques posteriormente levados à execução. Diante da inexistência de patrimônio em nome do devedor principal, o credor solicitou a inclusão da esposa no processo executivo, pedido inicialmente negado pelas instâncias inferiores. Ao analisar o recurso, o STJ reformou as decisões anteriores e fixou importante entendimento sobre responsabilidade patrimonial no casamento.
O caso julgado: dívida contraída durante o casamento
O processo tratava de cheques emitidos em 2021 pelo marido, enquanto casado desde 2010 sob o regime de comunhão parcial. Embora o título estivesse em nome exclusivo do emitente, o credor buscou a inclusão da esposa sob o argumento de que:
· a dívida foi constituída durante a constância do casamento,
· o regime de bens adotado pressupõe a comunicação do patrimônio adquirido no período,
· e determinadas obrigações assumidas por um dos cônjuges podem beneficiar diretamente a economia do lar.
As instâncias de origem rejeitaram o pedido, entendendo não haver responsabilidade automática da esposa por dívidas assumidas exclusivamente pelo marido.
O STJ, contudo, deu provimento ao recurso do credor e autorizou a inclusão da cônjuge na execução.
O embasamento jurídico da decisão
A fundamentação da Ministra Nancy Andrighi se apoiou, principalmente, nos arts. 1.643 e 1.644 do Código Civil, que tratam da administração da economia doméstica e das responsabilidades financeiras assumidas no casamento.
Presunção absoluta de consentimento
Segundo a relatora, a legislação estabelece presunção absoluta de consentimento recíproco para obrigações assumidas por um dos cônjuges em prol da economia doméstica. Isso significa que, independente de outorga uxória ou anuência formal, o ordenamento presume que ambos participam e se beneficiam das despesas necessárias à manutenção da entidade familiar.
Assim, a dívida contraída durante o casamento (ainda que em nome de apenas um dos cônjuges) pode atingir o patrimônio comum, especialmente quando relacionada a gastos inerentes à vida familiar.
Responsabilidade solidária pela economia doméstica
O art. 1.644 do Código Civil prevê que as obrigações domésticas vinculam solidariamente os cônjuges. A interpretação adotada pela 3ª Turma reforça a ideia de que, sempre que houver indício de que a dívida pode ter repercutido na economia comum, existe legitimidade passiva do outro cônjuge para integrar a execução.
O que a decisão não determina
Embora reconheça a legitimidade, a decisão não determina responsabilidade automática pelo pagamento. A inclusão do cônjuge:
· não implica presunção de culpa ou participação direta na dívida;
· não autoriza, de imediato, a constrição de bens particulares;
· não impede que o cônjuge exerça defesa própria, como demonstrar que a dívida não beneficiou a família ou não guarda relação com o regime de bens.
A relatora reforçou que caberá ao cônjuge incluído provar eventual incomunicabilidade de bens ou ausência de proveito comum, podendo opor embargos ou outras medidas de defesa.
Impactos práticos da decisão
A orientação firmada pelo STJ repercute diretamente em execuções de títulos extrajudiciais, especialmente naquelas em que:
· o devedor não possui patrimônio em seu nome;
· o casamento está vigente sob o regime de comunhão parcial;
· há indícios de que a dívida foi contraída durante o matrimônio;
· o credor busca ampliar as chances de satisfação do crédito.
Para credores
· A decisão fortalece a possibilidade de alcançar o patrimônio comum do casal, caso haja indícios de benefício à economia doméstica.
· Também oferece uma estratégia adicional em execuções paralisadas em razão da inexistência de bens penhoráveis em nome do devedor principal.
Para cônjuges incluídos
· A inclusão no polo passivo pode gerar consequências como citação, necessidade de apresentação de defesa, eventuais bloqueios sobre bens comuns e análise detalhada do regime de bens.
· Contudo, permanece assegurado o direito de comprovar que a dívida não possui qualquer relação com a vida familiar ou com o patrimônio comunicável.
Para o sistema jurídico
A decisão dialoga com precedentes anteriores, mas reforça e amplia o entendimento de que, no regime de comunhão parcial, a responsabilidade patrimonial pode alcançar o casal, desde que respeitados os limites legais da meação e da incomunicabilidade.
A decisão da 3ª Turma do STJ representa importante marco interpretativo sobre responsabilidade patrimonial dos cônjuges em execuções de títulos extrajudiciais. Ao autorizar a inclusão do cônjuge no polo passivo, o Tribunal consolida entendimento de que o regime de comunhão parcial de bens produz efeitos não apenas sobre os bens adquiridos durante o casamento, mas também sobre determinadas obrigações assumidas nesse período.
Em paralelo, mantém-se a garantia de ampla defesa, permitindo que o cônjuge incluído comprove a ausência de benefício à economia doméstica ou a incomunicabilidade de determinados bens.
Para operadores do Direito, especialmente aqueles que atuam em contencioso civil, família e recuperação de crédito, a decisão exige atenção redobrada ao regime de bens, ao histórico da dívida e às circunstâncias concretas de sua constituição.


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