OS REALITY SHOWS E O DIREITO A INTIMIDADE

mar. 08, 2022

Por Luciane Helena Vieira Pinheiro Pedro


Nunca a conhecida frase atribuída a Andy Warhol foi tão verdadeira. Parece que o mundo todo busca, hoje, a celebridade instantânea, seus quinze minutos de fama, nem que para isso tenha que fazer as coisas mais loucas.

Os programas televisivos conhecidos como reality show são um bom exemplo dessa busca desesperada por “aparecer”, criando e alimentando, em contrapartida, o voyeurismo televisivo, a invasão oficial e permitida – para não dizer incentivada – à intimidade alheia.

E é nesse ponto que surge questão interessante: será que esses programas constituem em si lesão a direito da personalidade, já que a pessoa expõe sua intimidade? É válido o contrato celebrado entre o participante e a emissora, em que o primeiro renuncia a eventual direito de indenização em decorrência de edição de imagens?

Antes de respondermos a tal indagação, cremos ser importante tecer algumas considerações a respeito do que sejam os direitos da personalidade.

Segundo o professor Miguel Reale, a pessoa “é o valor-fonte de todos os valores, sendo o principal fundamento do ordenamento jurídico” e, dentro dessa ótica, os direitos da personalidade podem ser definidos como os poderes que a pessoa exerce sobre si mesma, tendo como objeto do direito a própria pessoa, seus atributos físicos e morais.

Por serem intrínsecos à pessoa, os direitos da personalidade possuem como características a irrenunciabilidade, a inalienabilidade e a imprescritibilidade, seja qual for a vontade de seu titular, integrando o patrimônio da pessoa de modo absoluto – vez que são oponíveis erga omnes – e necessário – pois, se não existissem os direitos da personalidade, a própria pessoa não existiria como tal.

Mesmo antes de 2002, quando o Código Civil ainda não contemplava a tutela aos direitos da personalidade, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, inciso III, já elevara a dignidade humana ao centro do sistema jurídico, tutelando, de forma enfática, os direitos e garantias individuais. Tal proteção, após 2002, firmou-se ainda mais, pois os direitos da personalidade passaram a ser tutelados também no Código Civil, em seu Livro I, Capítulo II, artigos 11 a 20.

Dentro desse contexto, entendemos que os reality shows, ao exporem a imagem e a intimidade do participante, não constituem em si uma lesão a direito da personalidade, pois, da leitura do artigo 20 do Código Civil, se depreende que é possível a pessoa autorizar a utilização de sua imagem.

No caso do programa, o participante está plenamente ciente que seus atos serão registrados, o que, a nosso ver, não permite que ele alegue violação da intimidade ou privacidade, sendo importante frisar, entretanto, que não cabe limitação permanente e geral de direito da personalidade, conforme reconhece o enunciado nº 4 aprovado na I Jornada CJF, nos seguintes termos:

“Art.11: o exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral”.

Dentro dessa linha de raciocínio, cremos não ser válido o contrato celebrado entre o participante do reality show e a emissora de televisão, em que aquele renuncia a eventual direito de indenização em decorrência da edição de imagem, pois o artigo 11 do Código Civil é bem claro ao estabelecer que os “direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.

Assim, se a imagem do participante for utilizada com finalidade diversa ou de forma a acarretar injustificado dano à dignidade humana, pensamos ser possível que ele busque reparação por eventuais danos materiais e/ou morais. Caberá, nesse caso, ao juiz avaliar as circunstâncias do caso concreto, lembrando que, diante da culpa concorrente da própria vítima, o valor da indenização deve ser reduzido, conforme dispõem os artigos 944 e 945 do Código Civil.

Para finalizar, é importante destacarmos que a indenização é um instrumento para reparar o dano causado pelo desrespeito aos direitos da personalidade. Assim, pode a vítima deixar de exigir indenização, o que não implica renúncia ou alienação de seu direito personalíssimo, pois tal indenização não é uma contraprestação e, sim, uma reparação de um dano, reparação esta que a vítima, em determinada situação, pode considerar desnecessária ou ineficaz para sua finalidade e dela dispor livremente.

Autora: Luciane Helena Vieira Pinheiro Pedro

Por Pinheiro Pedro Advogados 25 abr., 2024
A proteção de crianças e adolescentes contra abusos emocionais durante processos de divórcio sempre foi uma prioridade. A Lei 12.318/ 2010, tem desempenhado um papel crucial nesse sentido. Em 2022, essa legislação passou por uma importante atualização com a introdução da Lei 14.340/2022. Esta nova lei estabelece a prática da "visitação assistida" para crianças e adolescentes, uma medida destinada a prevenir a alienação parental, merecendo destaque especial no Dia Internacional de Combate à Alienação Parental, comemorado em 25 de abril. De acordo com a advogada Renata Nepomuceno e Cysne, coordenadora do Grupo de Estudos e Trabalho sobre Alienação Parental do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a Lei garante que a criança e o adolescente tenham o direito mínimo de "visitação assistida" em locais designados pelo tribunal ou em entidades parceiras, exceto em casos em que um profissional qualificado ateste o risco de danos à integridade física ou psicológica. As visitas assistidas são aquelas em que um dos genitores interage com a criança sob supervisão de uma terceira pessoa, que pode ser um parente próximo, assistente social ou pessoa de confiança designada pelo juiz. Embora a lei use o termo "visitação", é mais apropriado chamá-la de "convivência", já que o objetivo principal é fortalecer ou reestabelecer os laços afetivos entre pais e filhos, incentivando cuidados mútuos. Para que a visita assistida seja determinada judicialmente, é necessário comprovar, no processo de guarda, o risco à integridade física e emocional da criança ou adolescente. Além disso, o juiz pode ordenar uma avaliação psicossocial de todos os envolvidos para entender melhor as condições psicológicas da família. Segundo Renata Cysne, a Lei 14.340/2022 já está tendo um impacto positivo no combate à alienação parental. Ela menciona iniciativas como o Espaço Laços e Afetos, criado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, que oferece um ambiente acolhedor e seguro para a convivência assistida entre crianças, adolescentes e familiares. Além disso, a lei prevê a revisão dos procedimentos para o depoimento de crianças e adolescentes em casos de alienação parental, visando evitar nulidades processuais. A Lei da Alienação Parental (12.328/2010) define essa prática como qualquer interferência na formação psicológica da criança ou adolescente que promova ou induza ao repúdio de um dos genitores, prejudicando os vínculos familiares. Embora tenha sido alvo de críticas, é importante destacar que essa lei não impede a convivência familiar, um direito fundamental garantido pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. A advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente do IBDFAM, defende a manutenção da lei, argumentando que sua revogação colocaria as crianças em situação de vulnerabilidade. Ela destaca a importância de capacitar profissionais para lidar com casos de alienação parental e a necessidade de procedimentos rápidos para verificar a veracidade das denúncias. Para ela, a conscientização da sociedade sobre a importância da convivência familiar é fundamental para garantir o bem-estar das crianças e adolescentes. Fonte: IBDFAM
Por Pinheiro Pedro Advogados 22 abr., 2024
O Tribunal de Justiça da Paraíba acatou o pedido de uma mãe e ajustou o modo como o filho convive com o pai, sob o entendimento de que o regime estabelecido anteriormente se assemelhava à guarda alternada, considerada prejudicial ao bem-estar da criança. De acordo com os documentos do processo, o arranjo determinado pela 1ª Vara de Família da Comarca de Campina Grande implicava na alternância do lar da criança a cada oito dias, entre a residência materna e paterna. Porém, esse regime se assemelha à guarda alternada, uma prática não regulamentada na legislação brasileira e desencorajada pelos profissionais da área de família. A mãe argumentou na ação que, durante o período em que a criança deveria estar com o pai, ela acabava ficando sob os cuidados dos avós paternos, já que o pai morava em outra cidade e não podia assumir a responsabilidade nos dias estipulados. Ela afirmou que isso estava causando confusão na mente da criança, dificultando a manutenção de uma rotina estável. Além disso, defendeu que seu lar sempre foi o ponto de referência para o filho, onde ele se sentia seguro e bem cuidado. A mãe ainda destacou que a mudança no regime de convivência não prejudicaria a relação entre pai e filho, pois não havia impedimento para a convivência entre eles, a qual poderia ser regulamentada de forma adequada. Ao analisar o caso, o juiz salientou a importância de distinguir entre a guarda compartilhada e a guarda alternada, reforçando que esta última não é recomendada pela doutrina e jurisprudência. Ele ressaltou que a guarda compartilhada envolve a participação ativa de ambos os pais nas decisões relacionadas à criança, enquanto a guarda alternada pressupõe que o menor passe períodos alternados com cada genitor. Assim, a guarda alternada não é aconselhável, pois pode confundir a criança e prejudicar seu desenvolvimento, especialmente considerando a tenra idade do filho do casal. Ele considerou apropriado designar o lar materno como ponto de referência, dada a forte ligação afetiva entre a mãe e a criança, desde o seu nascimento. Assim, foi estabelecido que o filho passaria os finais de semana alternados com o pai, além de metade das férias escolares e datas festivas relacionadas ao genitor e à sua família, bem como também seria permitida a comunicação por videochamadas. Nossa equipe concorda com a decisão, eis que prioriza o melhor interesse da criança, conforme preconiza a legislação brasileira. Essa determinação visa evitar que as crianças sejam submetidas a uma constante alternância de lares, o que poderia prejudicar seu desenvolvimento emocional e psicológico.
Por Pinheiro Pedro Advogados 11 abr., 2024
Em decisão provisória, a juíza Marcia Alves Martins Lobo, da 1ª Vara Cível de Águas Claras/DF, ordenou que a Unimed volte a fornecer plano de saúde a paciente com autismo. A magistrada constatou que a empresa cancelou o contrato de forma unilateral, o que vai contra as decisões anteriores do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo os documentos do processo, o paciente, diagnosticado com transtorno do espectro autista, está em tratamento médico e teve seu plano de saúde coletivo cancelado pela Unimed sem o seu consentimento. Por isso, ele recorreu à Justiça solicitando que a empresa ofereça um plano de saúde individual ou coletivo semelhante ao que tinha antes ou que mantenha o contrato atual. Ao examinar o caso, a juíza aplicou o entendimento do STJ de que não é aceitável que a empresa cancele o contrato de saúde unilateralmente, interrompendo assim o tratamento médico e prejudicando a saúde do beneficiário. Com base nesse entendimento, ela concedeu ordem de urgência para que a Unimed reative o contrato de assistência à saúde do beneficiário até que a ação seja julgada definitivamente, sob pena de pagar multa diária de R$ 1 mil até o limite de R$ 10 mil.
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